Zen, Terra Pura e Disciplina

É comum existir pessoas que se digam budistas, mas não são vegetarianas. Algumas acreditam realmente que budismo e vegetarianismo não tem nenhuma relação, às vezes até sendo sarcásticas quanto a isso. É comum a visão do budismo como sendo uma "filosofia livre de regras".
No texto abaixo há uma breve referência à prática budista chinesa do século XVI. Este texto desmitifica essas ideias comuns que as pessoas tendem a conectar tão facilmente com o budismo.


Um espelho para estudar o Zen
Yī Yuān Zōng Běn


Não há nada de particularmente especial sobre o método de estudar o Caminho: simplesmente purifique as faculdades sensoriais e os objetos sensoriais[1]
Boas pessoas! se vocês quiserem cultivar a iluminação suprema, vocês devem manter firmemente a disciplina e uma dieta vegetariana. Se vocês não mantiverem a disciplina estritamente, jamais alcançarão a iluminação. Por quê? Disciplina é a principal dentre miríades de práticas, a base das seis perfeições[2]. É como construir uma casa: primeiro se constrói uma fundação sólida. Sem uma fundação sólida, você constrói em vão.

Quanto à disciplina, refere-se às três disciplinas do Grande Veículo combinadas. Uma é a disciplina que cobre códigos de conduta, cortando todos os males, que é "Não cometer nenhuma forma de má ação". Outra é a disciplina que cobre as boas práticas, que reúne todas as formas de bondade, "Confiantemente praticar muitas virtudes." E a última é a disciplina de beneficiar todos os seres sencientes, então todos os seres são salvos. É ela "Universalmente livrar os seres sencientes."

São através destas três disciplinas reunidas que os bodhisattvas se tornam Budas. Somente se uma pessoa possuí estas três disciplinas ela pode praticar o Zen. Sem isso, é impossível praticar o Zen.
Você não leu o que diz no Sutra da Rede de Brahma?

Se os seres sencientes aceitarem a disciplina dos budas,
eles entrarão na senda do Buda.

Poderia ser ao contrário?
Os budas patriarcas dizem: "Disciplina pode engendrar concentração meditativa, e concentração meditativa pode engendrar sabedoria. Com sabedoria você ilumina a mente. Iluminando a mente, você vê a real natureza e se torna buda. Sendo um professor iluminado ou um buda, sempre se depende desta disciplina."
A área do estudo do Zen é o epítome dos mecanismos místicos da transcendência. Não é praticável para aqueles que relaxam[3].

Você deve gerar grande coragem e energia. Deve também cessar pensamentos, esquecer objetos complicadores, e reunir seu ouvir e ver e voltá-los à realidade inerente. Você deve, todos os dias, tomar suas perspectivas sobre o bem e o mal, seus gostos e desgostos, e seus sentimentos de afirmação e negação e varrê-los completamente.

O estudo do Zen é como uma espada afiada cortando através de uma meada de linhas: quando uma linha é cortada, todas são cortadas. É como cortar as cordas de anconragem, largá-las em um barco e velejar. É como um homem lutando contra mil: não há tempo para piscar, nem para hesitar e ficar em dúvida.

Se você pode realmente gerar este tipo de força de vontade inflexível, feroz, você terá a coragem para estudar o Zen.
Uma vez que você tenha essa coragem, tome conta da frase "Homenagem ao Buda Amitabha" como se você estivesse descansando na Montanha Polar e não pudesse ser abalado. Concentre sua mente e unifique sua atenção. Recite o nome do Buda algumas vezes, volte-se para a luz e se observe perguntando: Quem é este que recita?
Enquanto você se prende a isso, você deve ver onde está a atenção plena do buda e de onde esta recitação surge. Após um longo tempo, você verá através desta atenção plena. Adicione dúvidas ao topo da dúvida: questione-se quem está perguntando no último estágio "quem está recitando?".
Quando você chegar a isso, segure a corda firmemente e não a solte. É como ver um inimigo imortal. Segure firme: você deve compreender corretamente. Não há espaço par hesitar em pensamentos, não há tempo para discussões. Se você estudar o Zen desta forma, eventualmente você obterá sucesso.






[1] São as doze fontes das quais dependem os processos mentais. Consiste dos cinco órgãos sensoriais físicos e a consciência, e dos seis objetos chamados de fontes externas: olho e objetos visíveis, ouvido e som, nariz e odores, língua e sabor, corpo e toque, mente o objetos mentais.
[2] Pāramitā, seis qualidades que conduzem ao estado de Buda: Generosidade, Moralidade, Paciência, Energia, Contemplação direcionada, Sabedoria.
[3] Por exemplo, o Patriarca Dōgen, fundador da escola Sōtō Zen japonesa, dizia que apenas monges e monjas podiam alcançar a verdadeira iluminação através do Zen.


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