Renascimento no budismo

Saṃsāra, traduzido para o chinês como 輪廻, lún huí em chinês, ou rinne em japonês, é o termo que se refere ao ciclo de nascimentos e morte do budismo. Às vezes é traduzido como transmigração, outras como renascimento, e muitas vezes como reencarnação (termo este tido como inapropriado. Três termos muito próximos, mas cujo significado leva a intrincadas discussões.

O trecho a seguir faz parte do livro A vacuidade e o não eu - A concepção linguística do budismo (空と無我 ー 仏教の言語観), escrito por Akira Sadakata. Nesse trecho, Sadakata fala sobre sua opinião a respeito do conceito de saṃsāra de uma forma crítica, tema este controverso e complicado dentro do sistemas filosófico do budismo. Decidi deixar a palavra rinne traduzida por transmigração por considerá-la mais adequada no contexto.

O conceito de transmigração é supérfluo

Pela religião cuja existência eu reconheço, o conceito de transmigração é claro. Porém, o budismo que declara o conceito de anatma (selfless, não-eu) produz um problema difícil com a pergunta "o que transmigra?".

No meio dos indianos, a explicação de Nāgasena[1]  provavelmente não os satisfez. Em algumas escolas budistas, passou-se a pensar em um tipo de "eu" chamado pudgala[2], que une a mentalidade e as substâncias.

Entre as pessoas de hoje em dia, provavelmente há aqueles que veem o conceito de transmigração como algo físico: as plantas são comidas pelos insetos e a vida das plantas se tornam a vida do inseto; o inseto é comido pelo pássaro e sua vida se torna a vida do pássaro; o pássaro é comido pelo homem e se torna a vida do homem; o homem morre e sua vida se torna a vida das plantas na forma de nutrientes. Entretanto, este conceito não se limita à esta sucessão de matéria, mas é antes uma sucessão de almas. Uma alma se move sucessivamente entre várias vidas materiais.

Eu acho que o conceito de transmigração é infantil e não consigo acreditar nele. Nenhum de nós possui lembranças de nossas existências prévias. É mais simples pensar que não existe uma existência anterior. Sobre o fato de não termos nenhuma lembrança de vidas anteriores, citarei uma explicação indiana. No momento de passar pelo canal de nascimento nossa cabeça é pressionada, fazendo com que nossas lembranças se percam. Porém, como se explica aqueles nascido por cesariana que também não têm lembranças de existências passadas? Mesmo que tivesse existido uma existência prévia temporária, qual o sentido se elas não produzem lembranças?

Como algo que eu devo aprender do budismo, penso se não é melhor que este conceito seja excluído. Não acredito que o Buda e seus discípulos fossem oniscientes e onipotentes. Especialmente porque os discípulos de centenas de anos após a morte do Buda eram comuns e parecem que tornaram o conceito do não-eu em algo desinteressante. Manifesto um espírito crítico extremo ao tomar apenas aquilo que deva ser tomado. O budismo existe para nós, e não nós para o budismo.





[1] Personagem que faz parte do sutra “O Debate de Milinda”, onde o rei grego Menandro questiona o monge Nagasena sobre vários temas. Em breve será publicado o texto em questão.
[2]  Índivíduo, Pessoa ou seus sinônimos: personalidade, individualidade, ser, Self etc. De acordo com o budismo, são meros nomes para certas combinações de processos matérias e mentais, e separados deles não possuem existência real. Devem ser considerados como meros “modos convencionais de expressão”. [Buddhist dictionary. Manual of Buddhist Terms and Doctrines by Nyanatiloka]

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